quinta-feira, 23 de julho de 2009

O escafandro e a borboleta


Não sou especialista em filmes, tampouco uma cinéfila voraz. Vejo filmes quando sobra um tempinho, muitas vezes com muito atraso em relação ao lançamento. E daí? Filmes não apodrecem com o tempo; pelo contrário, amadurecem. Quando vamos ao cinema no calor da hora e em meio às críticas geralmente ficamos desapontados, porque as espectativas que criamos não se cumprem: é sempre o olhar do outro que está presente, e não o nosso próprio, claro (pode-se dizer o mesmo de adaptações de obras literárias para o cinema, em que predominantemente as primeiras superam seu correspondente na 7ª arte.

Bom, o fato é que queria assistir a O escafandro e a borboleta (2007) desde o seu lançamento no Brasil, mas só agora, de férias, pude vê-lo. Longe das críticas (positivas e negativas), meu olhar se voltou para a (possibilidade de) comunicação. Muito mais do que transmitir uma informação a outro ser, vemos ali, no código criado pela terapeuta, um exemplo rico de linguagem enquanto construção do ser no mundo. Isto é, na linguagem o sujeito se faz "eu"; pela linguagem ele age no mundo.

Acompanhamos as primeiras cenas do filme da perspectiva de Jean-Do e descobrimos com ele a agonia de não poder falar! Após ficar em coma 20 dias, ele acorda paralisado da cabeça aos pés. Apenas seu olho esquerdo tem algum movimento, que ele usará como canal de linguagem.

A beleza da comunicação no seu estado mais primitivo, áspero, está neste filme. É de doer.


quinta-feira, 16 de julho de 2009

Domésticas, o filme




Quase todos os meus alunos já viram esse excelente filme, que marca a estreia de Fernando Meirelles (junto com Nando Olival) na 7ª arte em 2001. Meus futuros alunos também o verão, certamente.


À primeira vista, Domésticas parece uma comédia, Traz cenas hilárias, personagens que passam por situações engraçadas - como o assaltante de ônibus desmascarado por usar uma arma de brinquedo - mas que, na verdade, representam gente de carne e osso, que usa a língua não padrão, que às vezes não entende o que é dito, que filosofa de forma bem intuitiva, que tem o conhecimento comum.



É triste, mas comprova-se, por esse filme, que "uma variedade lingüística ´vale` o que ´valem` na sociedade os seus falantes, isto é, vale como reflexo do poder e da autoridade que eles têm nas relações econômicas e sociais.” (Maurizzio Gnerre). Todo o preconceito linguístico está aí exemplificado: que sirva de reflexão para nós.





domingo, 12 de abril de 2009

Quem quer ser um milionário? (Slumdog millionaire)


Espero comentar esse filme no 7 ª Arte ano que vem. É impactante, é realista, desconcerta, faz repensar os padrões aos quais nos acostumamos. Você quer dinheiro para quê? Aliás, você quer dinheiro? Por que ele é tão importante? 
Jamal, protagonista do filme, decide entrar no programa para que sua amada, Latika, possa vê-lo.
O dinheiro não lhe interessa. A infância pobre é a escola de todo o conhecimento de Jamal... bem freiriano... não acham?
Um filme não ganha 4 Globos de Ouro e 8 Oscars por acaso. Há algo de bom nessa produção, embora o final seja hollyhoodiano demais.

Bom, lancei a semente, aguardo comentários.

quinta-feira, 26 de março de 2009

Sem medo de morrer (The Life Before Her Eyes)

A vida diante de seus olhos. Filme de Vadim Perelman, estrelado por Uma Thurman. Esse título, que perdeu parte da explicação do filme na sua tradução para o português - Sem medo de morrer - mostra a fragilidade diante da vida. Por isso o filme me tocou - muito.
O que é e o que poderia ter sido me acompanha desde que li 'A insustentável leveza do ser', de Milan Kundera: O 'se' não existe; quando se escolhe um caminho, todas as possibilidades, alternativas, se fecham. 
"Mas o que pode valer a vida, se o primeiro ensaio da vida já é a própria vida? [...] Não poder viver senão uma vida é como não viver nunca" (KUNDERA).
Diana, infelizmente, não teve essa escolha. Seu 'se' não ocorreu. Toda a sua vida (futura) passa diante de seus olhos diante da perspectiva do fim. O que ela imagina que poderia ter sido só faz sentido a partir do que ela mesma viveu. E a confluência do passado e do presente dinamiza a narrativa.
Vale a pena. Agradeço pela indicação do seu Jorge, pois não vi o filme nos cinemas.

Calmaria e vendaval

Choro e canto, mato e morro
Corro entre o bem e o mal
Sem querer faço da vida
Calmaria e vendaval
Passarinho e águia brava
Brisa mansa e temporal

Vendo o dia se apagando
Vejo a noite amanhecer
Passo o tempo procurando
Quem me possa responder
Como é que tem quem vive
Sem ninguém por quem morrer

Um caminho a gente encontra
Só questão de procurar
Se uma reta está no céu
Uma curva está no mar
Só não se acha saída
Quando a morte vem levar

            Vinicius de Moraes

sábado, 21 de março de 2009

Dançando no escuro


Filme lançado na França em 2000, tem como uma de suas atrações a cantora Björk no papel principal. Narra a história de Selma Jeskova, imigrante tcheca nos EUA, que sofre de uma doença genética que a levará à cegueira. Para evitar que o mesmo ocorra com seu filho, ela trabalha para juntar dinheiro para a operação que o curaria. O diretor e roteirista Lars Von Trier soube adicionar à história a dose perfeita de sensibilidade ao contrapor a ilusão de Selma à dura realidade de sua vida sem visão. São carregadas de cores as cenas em que Selma 'foge' do mundo real - pálido, seco, silencioso - para ingressar no musical de sua vida. Nesses momentos, a ternura invade a tela e vemos o que Selma vê - a realidade que seus olhos vêem.
A' cegueira' da moça certamente não lhe permitiu enxergar outras possibilidades para salvar a si e a seu filho. Essa é a metáfora, a meu ver, mais bela do filme. Pode nos mostrar a contraposição da vida que vivemos e a vida que imaginamos.
Destaque para o número musical nos trilhos do trem. Para encerrar, a voz de Pessoa:

"Temos, todos que vivemos,
Uma vida que é vivida
E outra vida que é pensada,
E a única vida que temos
É essa que é dividida
Entre a verdadeira e a errada.

Qual porém é verdadeira
E qual errada, ninguém
Nos saberá explicar;

E vivemos de maneira
Que a vida que a gente tem
É a que tem que pensar."

Fernando Pessoa